Publicado em 18 de agosto de 2019
Exibição de filmes no Quintal dos Pescadores envolve moradores
O espaço do Quintal dos Pescadores, na praia de Itaipu, une moradores em diversas atividades culturais. Com sua agenda aberta às necessidades da população da cidade de Niterói, o lugar já serviu para celebração de aniversários ou para aulas e debates. Um dos grandes atrativos para o público do bairro sempre foi o cinema, de forma que um dos organizadores de eventos, Leandro Augusto, percebeu a possibilidade de fazer cineclubes mensais com temas diversificados. Filho de pescadores e participante ativo das discussões do bairro, Leandro busca trazer temas latentes à população da aldeia de pesca nos materiais audiovisuais exibidos.
Apesar de a atividade já estar acontecendo há mais de cinco anos, agora a novidade é que o cineclube é mensal e tem data marcada na agenda: toda última sexta-feira do mês. Para os pescadores, é importante unir-se em um objetivo comum, uma vez que sofrem com a especulação imobiliária da região e tentativas de apropriação de seus terrenos, inclusive do Quintal dos Pescadores. Leandro relata que, apesar de sempre terem feito atividades, hoje em dia eles dão mais importância à comunicação com o público, a partir das redes sociais. “Nossa ideia é exatamente agregar as famílias em uma opção gratuita de lazer para a comunidade. O objetivo é transformar isso cada vez mais em um espaço cultural, que recebe mensalmente os eventos da comunidade”, defende.
Os moradores são convidados a participar de um espaço de debate que já levou às telas filmes sobre resistência e luta dos povos tradicionais, temas que dialogam diretamente com a realidade de muitos que vivem na região. Alguns dos filmes já exibidos foram “Arrastão”, “O Vendaval” e “Pessoas e Memórias”, este último sendo um inventário participativo sobre as histórias de vida dos moradores, produzido pelo Museu de Arqueologia de Itaipu.
O inventário foi exibido em agosto deste ano, contando com a presença de algumas das pessoas que participaram do processo de documentação, como é o caso do pescador Marcelo Lopes Dutra. Sendo um dos personagens do documentário, Marcelo conta que pôde reviver como foi esse processo de mudança em Itaipu: “Gostei muito que nesse filme tudo que é mostrado é a realidade da gente aqui. Com o tempo, nós fomos perdendo muita coisa. Mostra muito essa diferença do que era antigamente e o que é hoje em dia”, relata.
Outro morador de Itaipu e participante da luta dos pescadores é Rubens Pinho, que opina: “O filme é uma forma de compreensão da história local, através da oralidade e das memórias. Estar junto a eles e elas foi bastante significativo pela questão do pertencimento e do resgate histórico”, completa.
Existem grandes ameaças à continuidade da pesca artesanal, sendo uma das maiores preocupações a prática industrial da atividade, que pode ser devastadora para certas populações de peixe. A preocupação em manter a cultura dos moradores é o que os levou a organizar-se para criar uma Reserva Extrativista, concedida pelo poder público. Também conhecida como Resex, a reserva é um espaço territorial protegido, que busca a manutenção dos meios de vida e da cultura de populações tradicionais, o que também assegura o uso sustentável dos recursos naturais da área.
Não é só o potencial destrutivo de exploração da pesca industrial que os preocupa: muitos dos filhos de pescadores acabam seguindo outras áreas de trabalho, por conta da desvalorização da profissão e da maior possibilidade de acesso ao Ensino Superior. Ainda há o risco de a especulação imobiliária expulsar os moradores do espaço, como explica Leandro: “Ameaça a gente sofre o tempo todo. Sempre tem gente querendo tirar a gente daqui”, constata. Apesar disso, ele acredita que a organização dos moradores, inclusive na iniciativa de Resex, é o que garante a continuidade da pesca artesanal: “Acho que acabar não vai. Sempre vai ter alguém para seguir com a atividade”, avalia, com esperanças, o organizador do cinedebate.
Reportagem de Ana Luísa Vasconcellos
Fotos: Luciano